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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Vizinha.

É impressionante como quando se tem uma perda e essa se julga irremediável nasce um desejo meio que incontrolável pelo novo. Não, eu não perdi nada, mas esse desejo nunca me deixa. Acho que no meu caso é bem o contrário, ao invés de perder eu estou precisando é me achar. Vai saber.
E é aqui, no meio desse meu momento filosófico que começo minha mudança. Não, não. Não é algo assim tão profundo, só decidi trocar São Paulo por Florianópolis, e a mudança que eu digo é essa mesmo: tralhas, coisas pra desempacotar, bagunça, coisa pra consertar e tudo mais.
Gosto do clima da nova cidade. Gosto da calmaria, apesar do vazio que a loucura de Sampa tem me deixado. Aproveito para trabalhar e após alguns dias as coisas vão se encaixando, vou substituindo o caos e o vazio da minha casa e por conseqüente da minha vida. Gosto disso, dessa coisa de dizer “minha casa”, até a sonoridade dessa frase é bonita. “Minha casa”. E agora que tenho uma só para mim vou deixando ela a minha cara. Substitui as flores e as fotografias velhas da sala da minha mãe pela minha coleção de discos de vinil que estão devidamente colocados na nova estante. O quadro dos Beatles coloquei na parede da sala perto do sofá. Sempre achei que toda sala merece ter algo dos Beatles. Sempre achei que todo lugar merece um pouco de Beatles e por que não minha própria sala? O meu quarto ainda é só um colchão no chão e roupas jogadas por cima das malas, mas já é um bom começo. O meu começo. Agora é Radiohead tocando e um copo de Whisky pra comemorar. Por enquanto tudo bem solitário, mas amanhã quem sabe minha nova galera não apareça? É só uma questão de conhecer uma nova galera.
Só uma coisa errada até agora, o corretor devia ter me avisado que minha nova vizinha tem o dom de destruir músicas bacanas, em algum lugar Dave Matthews deve estar se contorcendo. Porque não é possível que ela cante gasguita assim e ache que está tudo certo, tudo lindo. Na verdade ela não canta nada e alguém devia ser bacana com ela e dizer isso, assim, na lata mesmo. Acho até que é por isso que o aluguel ficou barato no fim das contas, famílias devem ter fugido após alguns membros enlouquecerem ou quem sabe ficarem surdos. Tá, exagerei. Mas que às vezes irrita, irrita.
Mas apesar da voz, eu curti o gosto musical da garota e fico imaginando como ela é. Ainda não dei a sorte (ou azar, vai saber) de encontrar com ela pelo condomínio, o que tem alimentado ainda mais minha imaginação e tem sido o meu passatempo favorito. Sim, tenho passado horas dos meus dias imaginando o perfil da menina com a voz mais irritante que já ouvi. O que mais teria pra fazer em uma cidade que não conheço ninguém e só estou morando a uma semana do que flertar com as inúmeras mulheres que crio baseadas nas músicas que a garota ao lado coloca pra tocar a noite?
***
Num sábado desses, acordo cedo e coloco Joe Purdy pra tocar enquanto tento dar uma geral na casa. Sabe como é ser humano do sexo masculino, beirando os 30 anos, recém saído da casa dos pais, filho único e afazeres domésticos são coisas que dificilmente se encontraram na vida. Acontece que hoje finalmente terei algumas visitas e quero que minha casa pareça com uma. Depois de umas semanas no trabalho parece que tenho novos amigos e que eles querem tocar violão e beber até cair na minha casa. Achei bacana a idéia.
 No meio da bagunça começa tocar Why You, uma das minhas favoritas do Joe, e de repente ouço aquela voz desafinada acompanhando a música. Não acredito que ela conheça a minha banda favorita e eu ainda não vi o rosto dela. Qual é?  Eu preciso de um rosto pra descrever a mulher da minha vida para os meus novos amigos. Meio idiota isso, mas sempre disse que me casaria com uma mulher de bom gosto musical e que fosse fã de Joe Purdy sem eu precisar apresentar a ela. Dessa vez decido subir no muro, já que nossas casas são lado a lado e a julgar por quão perto parece estar a voz dela, acredito que nossos quartos também sejam lado a lado. Não custa nada tentar. Talvez hoje eu descubra se ela é ruiva e cheia de tatuagens como da primeira vez que a imaginei enquanto ela ouvia Foo Fighters. Ou se ela daquelas garotas fofinhas como a Zooey Deschanel, não consegui pensar em outra forma de garota em quanto ela ouvia The Smiths naquela terça-feira de madrugada. Mas não consigo pensar em nenhum jeito de garota para garotas que curtem Joe Purdy, ainda não conheci numa garota que curtia por conta própria. Pra acabar a curiosidade encosto a escada no muro e subo, e de todos os tipos de mulher que imaginei, de todas as vezes que pensei na gente se encontrando, nunca me passou pela cabeça o que acabei de ver. Ainda não decidi se gostei ou não, só sei que ri bastante e ela deve estar me odiando agora.
Parece que não sou só eu que andei de mudança pelas últimas semanas, ou vai ver ela só decidiu fazer uma reformar, mas quando subi no muro dei de cara com um quarto bagunçado, uma cama desmontada e uma garota só de calcinha dançando com uma ferramenta na mão. Claro, que como bom macho hétero que sou, a primeira vista só vi a bela morena de cabelos longos, cintura fina e seios nem grandes e nem pequenos, mas que cabem exatamente na palma da minha mão, e por alguns segundos imaginei minhas mãos naquelas maravilhas, assim como naquelas coxas roliças e bem desenhadas. Deus, que morena.
 Depois que consegui tirar os olhos da pequena e comecei a olhar ao redor foi que percebi a parte hilária da situação, não bastasse a moça quase desnuda, dançando com uma ferramenta na mão enquanto, acredito eu, desmontava uma cama, um pequeno detalhe foi que me fez gargalhar. A dona da voz que me incomoda noites sim, noites não, vestia apenas uma calcinha  daquelas de algodão, bem infantis e um pouco velha, sem muito elástico, me arrisco a dizer. Achei aquilo tudo tão lindo e bizarro ao mesmo tempo que minhas risadas sonoras invadiram o quarto da moça que me olhou assustada, logo depois envergonhada e por último enfurecida. Quando ela percebeu minha presença se abaixou em frente a janela e timidamente olhou pra ver se eu ainda estava lá, e eu, de uma forma imbecil, estava. Não sei por que fiquei ali, mas estupidamente quis puxar assunto, e puxei. Não é todo dia que isso acontece e sabe, acho que a gente tem que se arriscar.



A Paz de Jah!
;*

Um comentário:

End Fernandes disse...

Que legal Naty! Então você pensa em escrever um livro? Que bom! =D
Vá lapidando a ideia. O mistério sobre a menina morena atrevida realmente chama atenção pelo que trabalha e imaginação masculina. Não há como negar... kkk
Mas, veja tudo certinho. Para convencer uma editora a publicar o seu livro você terá de convencer que isso irá vender, não tem jeito é assim. Tanto é que muitos autores já fazem o livro pensando nisso como por ex agora tá na moda aquele 50 tons de cinza que dizem que tem um forte apelo sexual. Eu não li mas dizem que tem. Normalmente o homem é mais visual entao gosta mais de imagens. Acho que seria bom o seu livro ter gravuras. hehe Ou não também...
Um beijo Naty!
Se cuida
End Fernandes